quarta-feira, 5 de junho de 2013
O que é formatado (não) é bom.
O que é formatado
(não) é bom.
Ontem fui à
escola buscar um dos meus netos. Tem 7 anos e
está a completar o 2º ano. Após o lanche foi fazer os trabalhos de casa.
O de matemática fê-lo muito rapidamente, sem qualquer problema.
De seguida havia que
fazer uma composição tendo em conta um
texto que era mais ou menos o que segue
“Imagina, no final do ano letivo, uma visita ao jardim zoológico com os colegas
de turma, e um episódio divertido durante a visita”.
O miúdo pegou
numa folha de papel e começou a escrever, a espaços relativamente grandes e
regulares:
Quando
Onde
Personagens
Início da
história
O que aconteceu
O que aconteceu
Final da história
De seguida
começou a responder ao quando, ao onde e parou nas personagens.
Por princípio
nunca ajudo os netos, tal como nunca ajudei os filhos, a não ser em questões
muito concretas que me sejam colocadas. Como
não avançava perguntei o que estava a acontecer.
Não sei se nas personagens devo colocar “os animais
do jardim zoológico”.
Nessa altura perguntei-lhe.
Já tens alguma ideia de qual vai ser a tua história?
Não, não pode ser assim, primeiro temos que responder
ao que está no plano.
Reparei então que
no mesmo estava repetido “O que
aconteceu”. Pensei que tinha sido uma distração mas não. Segundo ele, teria que
ser mesmo assim.
Tentei
explicar-lhe que um escritor não pode estar assim tão preso a um guião mas ele,
já com lágrimas nos olhos, dizia-me.
Tem que ser assim e eu não posso pensar primeiro na história.
Achei melhor
terminar ali e sugeri que, mais tarde, fizesse a composição junto do pai. Mas
ele continuava a chorar.
Para descontrair
fomos a uma loja de brinquedos e ele escolheu um carrinho (de 1,5 euros...) que
eu já lhe havia prometido em tempos.
Levei-o a casa,
discretamente contei o episódio ao pai, que também considera que esta
formatação em nada ajuda a desenvolver a criatividade das crianças.
Até admito que
seja uma interpretação um pouco deformada por parte da criança mas, consultando
o caderno, verifiquei que esta formatação está sempre presente.
Pensei em
entrevistas feitas a escritores em que cada um revela uma forma diferente de
criar os seus textos. Por exemplo, para uns o título vem logo à cabeça, para
outros surge no fim, para outros vai variando ao longo da história (eu,
modestíssima escritora, incluo-me nestes últimos...).
E recordei Torrance
“com demasiada frequência a escola “mata” a criatividade “
Esta ideia de tudo formatar emerge hoje com demasiada
frequência. Nas minhas idas a escolas, encontro algumas em que os professores
têm que preencher uma série de papéis, altamente formatados, para justificar a minha visita e outra série
para descrever o que aconteceu durante a mesma. Por vezes comentam:
É por isso
que muitas vezes hesitamos antes de convidar alguém.
Em face desta formatação obsessiva presumo que, muitos dos que têm
poderes de decisão, terão escolhido para lema o slogan “ o que é
formatado é bom”...
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Como te dou razão!
ResponderEliminarNos manuais escolares obrigam-nos a dar "guidelines" para tudo o que é actividades orais e escritas, de modo a orientar o pensamento dos alunos. A minha colega - ela pp já formatada! - quer sempre dar os alicerces ou andaimes ( scaffolding, em inglês) para que os alunos não se percam!!
Lembro-me dos projectos Comenius em que participei durante dois anos. Obrigavam-nos a preencher n impressos como os nomes das escolas todas que participavam, numero de alunos, actividades que iam fazer, nomes dos profs participantes, verbas que iríamos precisar, materiais a usar, dias e aulas em que o projecto iria ser realizado, viagens, avaliação do projecto, comentários dos alunos ....e o diabo a 4. Desisti ao fim de dois anos e senti-me sempre "danada" porque aquilo tudo matava qq um.
O mesmo aconteceu com a formação. Levei dias e dias a juntar profs qualificados em inglês para apresentarmos um curso sobre audiovisuais, preenchi papelada até dizer basta, sofri horrores para calcular as despesas que iríamos ter com o projecto, visitei a Eurorumo onde havia os ditos aparelhos, fizémos um orçamento e no fim declararam-nos que a equipa não tinha credenciais para serem formadores ( 3 professores do British Council e eu que era orientadora há mais de dez anos). Nunca mais quis fazer nada que implicasse burocracia. Levava os alunos ao cinema e era tudo!!
Bjo
Angustia-me esta "burocracite" aguda e não vejo como extirpar este mal...
ResponderEliminarBjs
Regina
Também concordo que uma demasiada formatação mata a criatividade. E uma demasiada burocracia, como a que existe agora nas Escolas, mata o estímulo.
ResponderEliminarOrganização é uma coisa. Imposição é outra.
Um beijo.
Devo dizer que uma das tarefas que mais me custou em toda a vida escolar foi elaborar o meu curriculo para ascender ao 9º escalão. Ficou uma obra asseada, mas juntar toda a papelada, certificado, diploma, obras da minha autoria, etc.etc. me " tirou anos de vida". E para quê? Para provar o quê? Não era melhor irem assistir a aulas minhas ou perguntarem aos meus estagiários se eu valia algumas coisa?
ResponderEliminarExigese tanto em termos burocráticos aos profs que eles proprios já exigem que os projectos editoriais venham com a "papinha toda feita" ou seja, fichas de tudo quanto há, grelhas de avaliação, planos de aula, planos de ano, planos de unidade, ajuda para observação dos alunos, uma "chachada" que de certeza não é cumprida pelos profs que melhor ensinam.
Bjo
Esses "apêndices" para os os manuais constituíram uma das razões porque não acedi a convites de editoras para elaboração de manuais escolares.
ResponderEliminarUm bj às duas
Regina