Os professores
sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013
Educação, Cultura e Ensino.
A minha amiga Adelaide Pereira enviou-me hoje um artigo de sua autoria, que já foi publicado em 2012 do qual deixo alguns excertos
Porque não enraizar desde
as mais tenras idades, hábitos de conhecimento nas várias
áreas do saber, para que a cultura se transforme num gosto e numa
necessidade para todos?
Isto é possível. Fui ver ao
Rivoli uma peça intitulada “O Grande Musical da Química” inspirada na
peça do livro Breve
História da Química de Regina Gouveia(…)
(…)Qualquer pessoa de
qualquer idade iria achar interessantíssimo.
Isto
fez-me ver como, desta forma, é muito fácil conseguir transmitir
conceitos e torná-los acessíveis a qualquer pessoa e idade. Desta forma,
desenvolve-se o gosto de aprender(…)
(…)A educação quer seja
para a cultura, quer seja para a cidadania ou para a formação do
individuo é da responsabilidade e competência da família, da escola, das
organizações, do estado e de cada um de nós. Qualquer entidade
singular ou colectiva devia estar comprometida
na construção da educação
(em sentido lato) das nossas crianças e jovens, para que sejam
capazes de adquirirem espírito critico, atento, observador, mas também
aberto e contemplativo(…)
(…)Se isto é tão óbvio,
porque não se faz muito mais para criar hábitos de leitura nas nossas
crianças e jovens? A falta de hábitos de leitura (boa leitura) é, em grande
parte, responsável pelo fracasso destes em cultura geral e em
língua materna(...)
(...)Não basta falar de grandes
pintores, escultores se não se criam hábitos de visita aos museus. O mesmo vale para a boa
Música, essa arte para a qual devíamos reservar uns minutos todos
os dias(…)
(…)A arte, enquanto
manifestação do individuo, traduz as necessidades mais elementares, como tal,
as mais essenciais(...)
(…)A poesia, inegável forma
de arte, não raras vezes nos transcende e, no entanto, podemos
encontrá-la nas coisas mais simples e belas.
(…)Assim pensava, também,
António Gedeão(…)que diz num dos seus inúmeros poemas: “ Todo o
tempo é de poesia…”
Numa crónica (in Gazeta da
Física) com o título A LUA
ENTRE A CIÊNCIA
E A LITERATURA, escreveu
Carlos Fiolhais: … Tenho em mãos uma reedição
ilustrada, de apenas cem exemplares, datada de 2006 (do prelo da
Faculdade de Letras da Universidade do Porto, com introdução de Maria
Luísa Malato Borralho). E leio uma engraçada sátira social, com a forma
roubada a Os Lusíadas. O argumento é científico: Matemáticos pontos combinando,/ Tendo por base a
grande
Astronomia,/
Um Génio, que não tem nada de brando, / Projecta ir ver o Sol,
fonte do dia: / Em pejado Balão vai farejando,/ Subindo mais e mais
como devia;/ Divisa a Lua, mete-se por ela, / Pasma de imensas cousas
que viu nela. Mas, partindo
da ciência, a literatura voa livre.
A Lua, nesta utopia
portuguesa, está povoada pelos Lulanos, nome parecido com Lusitanos.
Mas, como numa utopia à la More tudo deve ir ao contrário, eis que nessa
Lua habitada, ao contrário de Portugal, a justiça funciona: Aqui não há ladrões! Se um aparece. / É logo e
sem demora
castigado; /Tenha empenhos ou não, ele padece,/ Sofrendo o que na
Lei lhe é destinado.
Há que fazer
justiça a Bocage e a Rodrigues da Costa, por
cruzarem a ciência, ou melhor,
a tecnologia, com a arte.
Se eles não têm a notoriedade de Kepler e de Poe deviam ter, pelo
menos, uma maior notoriedade no vasto espaço da língua portuguesa.
(fim de citação).
Também hoje recebi , via e-mail, um texto de Valter Hugo Mãe que é como que um complemento do anterior, na medida que fala de professores.Este texto foi publicado em
Autobiografia Imaginária | Valter Hugo Mãe | JL
Jornal de Letras, Artes e Ideias | Ano XXII | Nº 1095 | 19 de Setembro de 2012 e pode ser lido aqui
Deixo também alguns excertos
Os professores
(...)A escola, como mundo completo, podia ser esse
lugar perfeito de liberdade intelectual, de liberdade superior, onde cada
indivíduo se vota a encontrar o seu mais genuíno, honesto, caminho. Os
professores são quem ainda pode, por delicado e precioso ofício, tornar-se o
caminho das pedras na porcaria do mundo em que o mundo se tem vindo a tornar.
Nunca tive exatamente de ensinar ninguém.
Orientei uns cursos breves, a muito custo, e tento explicar umas clarividências
ao cão que tenho há umas semanas. Sinto-me sempre mais afetivo do que efetivo
na passagem do testemunho. Quero muito que o Freud, o meu cão, entenda que
estabeleço regras para que tenhamos uma vida melhor, mas não suporto a tristeza
dele quando lhe ralho ou o fecho meia hora na marquise. Sei perfeitamente que
não tenho pedagogia, não estudei didática, não sou senão um tipo intuitivo e
atabalhoado. Mas sei, e disso não tenho dúvida, que há quem saiba transmitir
conhecimentos e que transmitir conhecimentos é como criar de novo aquele que os
recebe.
Os alunos nascem diante dos professores, uma e
outra vez. Surgem de dentro de si mesmos a partir do entusiasmo e das palavras
dos professores que os transformam em melhores versões. Quantas vezes me senti
outro depois de uma aula brilhante. Punha-me a caminho de casa como se tivesses
crescido um palmo inteiro durante cinquenta minutos. Como se fosse muito mais
gente. Cheio de um orgulho comovido por haver tantos assuntos incríveis para se
discutir e por merecer que alguém os discutisse comigo(...)
(...) Dá-me isto agora porque me ando a convencer de
que temos um governo que odeia o seu próprio povo. E porque me parece que
perseguir e tomar os professores como má gente é destruir a nossa própria casa.
Os professores são extensões óbvias dos pais, dos encarregados pela educação de
algum miúdo, e massacrá-los é como pedir que não sejam capazes de cuidar da
maravilha que é a meninice dos nossos miúdos, que é pior do que nos arrancarem
telhas da casa, é pior do que perder a casa, é pior do que comer apenas sopa
todos os dias.
Estragar os nossos miúdos é o fim do mundo.
Estragar os professores, e as escolas, que são fundamentais para melhorarem os
nossos miúdos, é o fim do mundo. Nas escolas reside a esperança toda de que, um
dia, o mundo seja um condomínio de gente bem formada, apaziguada com a sua
condição mortal mas esforçada para se transcender no alcance da felicidade. E a
felicidade, disso já sabemos todos, não é individual. É obrigatoriamente uma
conquista para um coletivo. Porque sozinhos por natureza andam os destituídos
de afeto.
As escolas não podem ser transformadas em lugares
de guerra. Os professores não podem ser reduzidos a burocratas e não são
elásticos. Não é indiferente ensinar vinte ou trinta pessoas ao mesmo tempo. Os
alunos não podem abdicar da maravilha nem do entusiasmo do conhecimento. E um
país que forma os seus cidadãos e depois os exporta sem piedade e por qualquer
preço é um país que enlouqueceu. Um país que não se ocupa com a delicada tarefa
de educar, não serve para nada. Está a suicidar-se. Odeia e odeia-se.
À Adelaide Pereira e a Valter Hugo Mãe, muito obrigada.
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Concordo com tudo isto, Regina, mas sou extremamente pessimista quanto às formas de educação que se estão a usar neste país. As crianças passam 2/3 do dia na Escola, algumas vezes a aprender, muitas das vezes só a brincar para que os pais possam trabalhar até às 7-8 horas ou mais. Nos tempos livres ainda vão ao ballet, à música, à piscina ou jogar futebol em dia certos , chegando a casa estafados com quase 12 horas de actividade lectiva e não lectiva no "bucho". Quando é que podem ler???
ResponderEliminarOs meus netos só lêem ao fim de semana, não têm hipóteses de ler durante o dia à semana. E mesmo assim há a concorrência dos filmes e videos do computador - eles nem sequer têm TV, felizmente.
Quanto à educação para a cidadania, constato que os programas de TV são cada vez mais deseducativos, brejeiros e mesmo porcos. As telenovelas, que muitos adolescentes adoram são de nível baixíssimo e costumes amorais. Só chantagens e vinganças, o poder, o dinheiro, etc.
Como é que os Pais podem educar contra tudo e contra todos?
Leio tudo isto com muita apreensão....
Bjo
Olá Regina
ResponderEliminarGostei bastante quer do texto da Adelaide, quer do texto de Valter Hugo Mãe.
As crianças são o futuro e portanto é preciso cuidar da sua educação que deve vir da família, mas também muito da Escola.No entanto num País onde as pessoas estão sobrecarregadas de trabalho ou desempregadas, onde os professores são tão maltratados, onde as crianças vão para a Escola com fome,onde a miséria é uma grande aliada do crime,que fazer pelas nossas crianças e jovens?
Acho que é preciso remodelar o sistema, o que é difícil e lento. Mas a esperança não se extingue e espero que se consiga chegar a uma situação de maior equilíbrio.Já não é para mim, mas acredito que os meus filhos e principalmente os meus netos e possíveis bisnetos, vejam essa esperança concretizada.
Um beijo, Regina
Obrigada Regina por referir o meu artigo, mas na verdade foi a leitura do seu ultimo livro o ponto de partida para o artigo. Portanto o mérito foi em primeiro lugar da Regina.
ResponderEliminarUm garnde abraço,
Adelaide Pereira