Bem-vindo, bienvenido, bienvenu, benvenuto, welcome....


Silêncio cósmico

Pudera eu regressar ao silêncio infinito,

ao cosmos de onde vim.

No espaço interestelar, vazio, negro, frio,

havia de soltar um grito bem profundo

e assim exorcizar todas as dores do mundo.

Regina Gouveia

NOVO BLOGUE

Retomei o blogue que já não usava há anos.

https://reflexoeseinterferncias.blogspot.com/

Dedico-o essencialmente aos mais novos mas todos serão bem vindos, muito em particular pais, avós, encarregados de educação, educadores ...


sexta-feira, 12 de abril de 2019

Efemérides- 2


No final da última mensagem, prometi referir-me à surpresa que o meu filho Miguel e a  minha nora Teresa nos fizeram no dia 29 de Março, dia em que se cumpriram 50 anos sobre o nosso casamento.
Uma “celebração” da efeméride, muito simples e íntima, está agendada para o domingo de Páscoa. No dia, pensávamos celebrar só os dois. Na celebração estavam incluídas a passagem por S. Martinho de Anta e por S. Miguel de Seide.

Numa mudança de planos, à última hora, adiámos a saída do Porto para o dia 30.

No dia 29, quando nos preparávamos para jantar, o meu filho Miguel, que mora mesmo ao nsso lado, chegou e disse: Não faz sentido estarem a jantar sozinhos no dia hoje. Tragam o jantar, juntamo-lo ao nosso e jantamos lá em casa, em conjunto. Aceitámos sensibilizados. Quando, vestidos com uma roupa de andar por casa, nos preparávamos para ir, o meu filho disse: Embora seja apenas um jantar entre nós, é um dia especial pelo que vistam algo melhor. Comecei a achar que haveria ali qualquer coisa estranha…

Mal chegámos fomos surpreendidos pela presença de filhos, noras, netos e primos, num ambiente de festa que não imaginaria, pois dispuseram de pouquíssimo tempo para organizar tudo, dado que a nossa mudança de planos tinha sido inesperada. A ideia de compartilharmos o jantar fora apenas um truque para não desconfiarmos de nada...

Obrigada a todos, muito em particular à Teresa que teve muito trabalho.


No dia seguinte saímos do Porto, em direcção a S. Martinho de Anta. Logo à entrada, o Espaço Miguel Torgaprojeto do Arq. Souto Moura, um edifício muito interessante de que podem ser
vistas boas imagens aqui



No seu interior, uma exposição permanente, dedicada á vida e obra de Miguel Torga, 
Alguns documentos em exposição


 Torga e a mãe

O Nobel que não recebeu....   

 
 




A par desse espaço existe  um outro para exposições temporárias, um auditório, uma cafetaria,uma biblioteca e  uma loja

Após a visita ao Espaço Miguel Torga fomos visitar lugares emblemáticos na aldeia- o negrilho, a escola que frequentou, a casa onde nasceu e que está em obras a fim de ser convertida em museu, depois de doada para esse fim por Clara Rocha, filha de Torga e  Andrée Crabbé, o cemitério onde o casal  está sepultado

 


O que resta do negrilho, que tal como inúmeros ao longo do país, foi atacado há anos por uma epidemia.

A um negrilho

Na terra onde nasci há um só poeta
Os meus versos são folhas dos seus ramos.
Quando chego de longe e conversamos,
É ele que me revela o mundo visitado.     
Desce a noite do céu, ergue-se a madrugada,
E a luz do sol aceso ou apagado 
É nos seus olhos que se vê pousada.
Esse poeta és tu, mestre da inquietação Serena! 
Tu, imortal avena
Que harmonizas o vento e adormeces o imenso
Redil de estrelas ao luar maninho.
Tu, gigante a sonhar, bosque suspenso
Onde os pássaros e o tempo fazem ninho!
Miguel Torga in Diário VII



Igreja de S. Martinho de Anta. Por detrás é o cemitério.


Jazigo de Torga  Andrée Crabbé,  bonito porque  sóbrio-uma pedra de granito gravada com os dois nomes





Almoçámos em S. Martinho e a seguir ao almoço fizemos uma passagem  por Sabrosa, terra de solares e casas senhorias...

Um dos mais bonitos é agora unidade hoteleira





Numa rua deparámos com a casa que supostamente pertenceu a Fernão de Magalhães

São ainda hoje muito confusos os dados sobre a naturalidade e filiação deste grande português. Embora tudo leve a crer que tenha nascido na Casa da Pereira, de Sabrosa, no último quartel do século XVI, e que tenham sido seus pais, Rui de Magalhães, casado com D. Alda da Mesquita Pimentel de Vila Real.
Finda a passagem por Sabrosa, regressámos a S. Martinho de Anta para visitarmos a "Mamoa" que fica muito perto da aldeia


A Mamoa de Madorras destaca-se pela sua monumentalidade e estado de conservação e por essa razão, aí se realizaram algumas intervenções científicas as quais proporcionaram resultados inovadores e de extrema importância para o conhecimento das comunidades que, há cerca de 
6 000 anos, construíram esta imponente sepultura e habitaram a região.




A terminar o nosso passeio por terras de Torga fomos a Panóias

“Panóias, 6 de Outubro de 1951 
Volto a este livro de pedras, onde o passado deixou gravadas as suas devoções. 
Estou nisto: coisas que falem, que respondam. Marcos, estrelas ou fragas com inscrições, mesmo delidas, onde a gente soletre uma intenção, um protesto, um voto. 
O pasmo bovino da natureza movimentado, contrafeito, 
reduzido pela compreensão a palavras ou caracteres inteligíveis. 
Paisagem com voz, que dialogue.”
 Miguel Torga, Diário VI, Coimbra, 1953

O Santuário de Panóias terá sido construído entre os finais do século II e os inícios do século III d. C.  Existem  ali  testemunhos de um rito de iniciação dos mistérios das divindades infernais
Terá sido C. G. Calpurnius Rufinus, senador romano, que introduziu esse  culto em Panóias 

Três grandes fragas erguem-se, entre outras, numa colina ligeiramente inclinada. Nas fragas, existiram outrora, templos erguidos em honra dos deuses. Nos afloramentos rochosos ainda estão cavadas as pias para onde jorrava o sangue dos animais sacrificados, os espaços para a queima das vísceras,e escadas talhadas também na rocha que levavam o peregrino até ao templo.

Os Sacerdotes, alinhados, esperam a vítima. A faca trespassa o animal, enquanto o sangue escorre… Evoca-se Serápis, o deus dos Mortos.
Os fogos já estão acesos, e as labaredas rodopiam as sabor do vento. Queimam-se as vísceras das vítimas enquanto nos poços, já a transbordar do sangue da besta, os neófitos se vão purificando, banhando-se no líquido ainda quente.
Numa das rocha lê-se: “Aos Deuses e Deusas e também a todas as divindades dos Lapitaes, Gaius C. Calpurnius Rufinus, membro da ordem senatorial, consagrou com este recinto sagrado para sempre uma cavidade, na qual se queimam as vítimas segundo o rito”. 







Nesta rocha, as gravações acima referidas



Dos roteiros torguianos fazem parte vários outros pontos, nomeadamente o Solar de Mateus e o miradouro de S. Leonardo de Galafura que já visitámos em outras ocasiões.  
A nossa visita a “Torga” terminaria aqui, mas a mensagem não podia deixar de conter o poema a S. Leonardo de Galafura e um breve vídeo

À proa dum navio de penedos,
A navegar num doce mar de mosto,
Capitão no seu posto
De comando,
S. Leonardo vai sulcando
As ondas
Da eternidade,
Sem pressa de chegar ao seu destino.
Ancorado e feliz no cais humano,
É num antecipado desengano
Que ruma em direcção ao cais divino.

Lá não terá socalcos
Nem vinhedos
Na menina dos olhos deslumbrados;
Doiros desaguados
Serão charcos de luz
Envelhecida;
Rasos, todos os montes
Deixarão prolongar os horizontes
Até onde se extinga a cor da vida.

Por isso, é devagar que se aproxima
Da bem-aventurança.
É lentamente que o rabelo avança
Debaixo dos seus pés de marinheiro.
E cada hora a mais que gasta no caminho
É um sorvo a mais de cheiro
A terra e a rosmaninho!
 Miguel Torga in Diário IX

 O dia estava a chegar a fim.

No dia seguinte iríamos  visitar S. Miguel de Seide


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