sexta-feira, 1 de novembro de 2013
Pequenas estórias edificantes
Pequenas estórias
edificantes é o título de uma mensagem de António Mouzinho, “postada” em de
Rerum Natura. Não resisto a colocar aqui as duas últimas.
Segunda:
Recentemente, numa
escolinha (adoro «escolinha»…) que eu cá sei, um senhor inspetor chumbou uns quantos
horários: horários do secundário, de professores com ombros largos, em fim de
carreira (uma espécie de brucewillies do secundário).
A dita escolinha decidiu,
em remate de silly season, acabar com dias sem carga letiva: ter a
certeza de que não havia nenhum professor que estivesse mais de 2 dias sem ir à
escola—o sábado e o domingo. Mas apesar deste esmero, deste zelo administrativo
(detroika local), com resultados engraçadíssimos nos professores
mais antigos e com cargas letivas mais pequenas (por via da antiguidade e dum
alívio—confesso, discutível—da carga estritamente de aulas), apesar, dizia eu,
deste zeloso delírio—o senhor inspetor chumbou!
Os horários deviam ter 14
horas letivas, mas as disciplinas dadas proporcionavam horários de 13 (em Geometria
Descritiva) ou 12 (em Matemática). As horas que faltavam eram completadas com
componentes de horário equiparadas a tempos lectivos. Isto proporcionava
algumas manobras interessantes, mas uma misturadora de betão conhecida por
direção geral entreteve-se a baralhar e criar restrições às possibilidades, de
forma que ninguém consegue acertar esse tipo de equação. Consegue-se empatar o
professor na escola todos os dias da semana, consegue-se as horas de trabalho
semanal que mandam os cânones, consegue-se tudo menos acertar a coisa para o
senhor inspetor.
Parece idiota?
Emudeço de pasmo.
Perguntou o inspetor:
porque foi que a escola fez estes horários com estas disciplinas, níveis e
professores? Respondeu a escolinha: porque temos professores mais hábeis do que
outros a dar estes níveis e disciplinas.
(Vantagem para o aluno…)
Retorquiu o inspetor: não
quero saber disso para nada—o meu ponto de vista é administrativo, não
pedagógico; reformulem-se os horários, ou há processo disciplinar.
Assim vai o ensino
secundário neste país?
É de crer que sim…
Sabe «ler», o senhor
inspetor?
Sabe: nós é que ainda não
percebemos que estas duas estórias são versões da mesma, e espelham, não um
exemplar, mas um ror de governações. O único que sabe ler é o senhor inspetor
(decorou a silhueta da coisa), e quem não acreditar leva um processo
disciplinar.
Moral da estória: cada ministro que
chega que se cuide: isto está repleto de candidatos ao título de «O Piorrrr De
Sempre», o próprio ministro é concorrente, e não dá para todos—há percentis.
Terceira:
Adoeci este ano. Nunca
acontece; aconteceu.
Fiz o que mais detesto:
faltei a aulas.
Ignorante de novidades
neste domínio, de que não ando a par, pus-me ao telefone para tomar
previdências: avisar o coordenador da ausência de uma semana e pedir-lhe que
tomasse algumas medidas para esse período; avisar o representante dos pais de
uma turma de que sou diretor, dar-lhe uma satisfação e pedir alguma
continuidade no trabalho pessoal dos alunos; avisar a direção e saber, da
secretaria, se o certificado médico de doença que tinha em meu poder era
suficiente, e em que prazos deveria proceder à respetiva entrega.
Da secretaria deram-me os
esclarecimentos necessários, e acrescentaram: sabe que não vai receber o
ordenado dos três primeiros dias e, de seguida, só recebe 90%?
Não sabia.
Quando voltei à escola,
tinha a vida atrasada uma semana. Ora se, numa repartição de finanças, um
funcionário faltar—o que acontece?: o atendimento é feito pelos colegas.
O patife é penalizado
financeiramente, porque o trabalho dele foi garantido por outros.
Se, na limpeza de ruas,
faltar um funcionário, que é que se passa?: a recolha é dividida por colegas.
O marau leva um chumbo no
ordenado, porque a limpeza ficou feita, e ele não esteve presente.
Se um médico, num hospital
do estado, baquear, o que é que se segue?: os doentes são tratados na mesma, e
o país segue, imperturbável.
O tratante nem sequer
devia estar doente—é médico, que diabo!—e os colegas é que asseguraram a saúde
pública.
Ora: a mim ninguém me
substituiu. Cheguei à escola e lá estavam, todos juntos, os meus alunos, com os
conhecimentos no mesmo estado.
Que posso concluir? Que o
ordenado que me foi retirado me dispensa de dar a matéria que estava prevista
para essa semana.
Que o ministério vai pegar
no carcanhol—enfim, na massa—e dirá a um colega com a minha experiência e
careca: "ó rapaz, vai ali àquela escola dar esta matéria assim assim, que
o biltre adoeceu—mas já lhe sacámos o nosso!, e alea iacta est."
Estou, portanto
descansado: essa semana de matéria será garantida—por outro funcionário.
Moral da estória: pfff, sei lá!
António
Mouzinho
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Sem moral, Regina.
ResponderEliminarUm beijo.
Meu Deus se houvesse um blogue em que todos os professores escrevessem o que se passa de escandaloso nas escolas, poderiam entupir a Internet!!
ResponderEliminarCada vez dou mais graças a Deus por não estar metida nessas tricas nem ser vítima de pessoas que são promovidas a inspectores só porque pertencem ao PSD ( soube dum caso quando era professora), mesmo que não tenham a mínima preparação para decidir e julgar os casos nas escolas.
Ler coisas sobre a escola hoje em dia deprime-me….
Bjo
Também me deprime mas infelizmente continua a haver muito boa gente que acha que os professores têm sido uns privilegiados dos sistemas. Por isso é importante denunciar todas estas barbaridades
ResponderEliminarBj às duas
Regina