Bem-vindo, bienvenido, bienvenu, benvenuto, welcome....


Silêncio cósmico

Pudera eu regressar ao silêncio infinito,

ao cosmos de onde vim.

No espaço interestelar, vazio, negro, frio,

havia de soltar um grito bem profundo

e assim exorcizar todas as dores do mundo.

Regina Gouveia

NOVO BLOGUE

Retomei o blogue que já não usava há anos.

https://reflexoeseinterferncias.blogspot.com/

Dedico-o essencialmente aos mais novos mas todos serão bem vindos, muito em particular pais, avós, encarregados de educação, educadores ...


segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Em boa companhia...

A bursite trocantérica, que me serve de companhia (má companhia, é óbvio) há cerca de 2 meses e me tem obrigado a fazer uma panóplia de tratamentos (infiltrações, fisioterapia, eletroterapia….) tem-me deixado mais tempo tempo livre para outras companhias mas, desta vez, fantásticas… Refiro-me à literatura e à música.

Desde que adocei já li e /ou reli vários livros. Um deles foi-me oferecido pelo meu filho mais velho, já depois de detetado o meu problema. Trata-se do livro O bebedor de Horizontes, livro três da Trilogia As areias do Imperador, de Mia Couto. Sabendo que é um autor de que gosto muito, ofereceu-mo autografado.
O ouro foi A guerra do fim do mundo de Vargas Llosa que o meu marido me ofereceu no meu aniversário, em Outubro. Como é enorme, tinha reservado a sua leitura para quando dispusesse de muito tempo.. É muito interessante e simultaneamente chocante.
O mesmo acontece com o livro O Grito Silenciado de Ana Torjada que, no Natal, ofereci ao meu marido, que ainda não teve oportunidade de o ler. 
Em Agosto de 2000, Ana Torjada e duas companheiras deslocaram-se ao Afeganistão e ao Paquistão. Puderam observar no terreno a situação dos refugiados afegãos no Paquistão( a miséria, a exploração laboral, o trabalho infantil e a quase inexistente ajuda internacional). No Afeganistão, nomeadamente em Cabul, constataram de perto a repressão taliban. Puderam também testemunhar a luta clandestina de muitas pessoas que põem em risco a própria vida, usando as armas da educação, da cultura e da tolerância.

A leitura deste livro levou-me a reler Pensatempos  de Mia Couto.

Neste momento estou a reler Umberto Ecco, A Misteriosa Chama da Rainha Loana

Quanto à música, tenho ouvido a antena 2 e não só. Recebi um mail sobre o Theremin, instrumento de que, confesso a minha ignorância, nunca ouvira falar, apesar de ser um dos primeiros instrumentos totalmente eletrónicos, logo uma dos “prodígios” da Física…
Em plena Guerra Civil Russa, Léon Theremin andava às voltas com uma investigação patrocinada pelo governo russo em sensores de proximidade. Basicamente era um estudo sobre as interferências das mãos nos transmissores radiofónicos que alteravam as frequências e prejudicavam irritantemente as comunicações. Certamente dotado de uma sensibilidade fora do comum, Theremin foi rodeado pela beleza sonora quase surreal que advinha de tão incómoda interferência. Tinha à sua frente dois osciladores (basicamente duas antenas de metal) de alta frequência por onde circulava a invisível corrente eléctrica, e quando aproximava a mão de uma das antenas, ao alterar a sua frequência, surgia misterioso e infinitamente belo este som que o percorria, como um arrepio pela coluna, como uma corrente leve e agradável. Reparou entretanto que com uma mão conseguia controlar a frequência e com a outra a amplitude, ou volume. Foi então que decidiu amplificar estes sons novíssimos e ligar o instrumento a uma coluna. Aí deu-se o êxtase. O orgasmo sonoro.
Se Deus ou Deuses ou Anjos ou Diabos tocassem um instrumento musical, esse instrumento seria, sem dúvida, o Theremin. Apoteótico, reveste-se de um som etéreo, capaz de invadir o corpo, capaz de estilhaçar a alma. É mágico. Um instrumento musical que não se toca. Ou que se toca sem se tocar. O instrumentista do theremin, o theremista, assemelha-se a um maestro sem batuta, a comandar uma orquestra invisível, a embriagar o ouvinte com éter. O theremin soa como o vento na frincha da janela, como o canto hipnótico de uma sereia, como a presença invisível de um fantasma.

Aqui podemos ver Léon Theremin tocando o “theremin”
https://www.youtube.com/watch?v=_3H5JbkPXpw

Aqui temos a theremista Clara Rockmore interpretando The Swan de Saint-Saëns
https://www.youtube.com/watch?v=pSzTPGlNa5U

Mais duas interpretações usando o theremin  O Mio Babbino Caro de Puccini e Over The Rainbow
É por demais sabido como a música ativa o cérebro. A esse propósito deixo mais um vídeo


E porque falei de literatura e música deixo alguns poemas meus

Pastoral
Ainda hoje não sei se apenas o sonhei ou foi real.
A orquestra tocava a Pastoral e eu, comovida, aplaudia.
Pareceu-me ver que estremecia a flor que eu usava na lapela.
Creio que também ela se comovia.
Ou então seria por causa da tal da ressonância.
Sei que a minha mente era toda ela sinfonia e fragrância.
Ao allegro seguia-se o andante e mais adiante
um outro allegro, a tempestade - Beethoven, a genialidade.
O som crescia, enchia todo o ar, e, de repente,
um dos violinos pareceu-me ser um querubim
não sei se aquele do canto do jardim
se o outro, na capela à direita no altar.
Pareceu-me que eu estava a flutuar
e que a orquestra tocava a Pastoral só para mim.
Ainda hoje não sei se tudo isto eu sonhei
ou se foi mesmo assim tudo real.
(in Reflexões e Interferências, 2002)

Acordes
Que acordes são estes que subtis irrompem no meu espaço-tempo?
De onde vêm estes sons que me transportam
a outra dimensão no cosmos infinito?
Presto assai, allegro moderato, andante lento -
sinfonia que vem do alfa e vai em direção a um ómega ignoto,
difundida por entre as estrelas, a propagar-se na matéria escura
talvez vinda dum tempo remoto, em que ainda não havia tempo,
talvez ainda antes da criação do mundo,
quem sabe transportada pela radiação de fundo.
Na noite calma, embala-me esta música que não identifico,
e onde, entre um tanger de cítaras e harpas, se impõe sublime, um violino
Acordo, deixo o cosmos etéreo, esfuma-se o som divino.
O som que escuto agora é bem real. Apenas um bater de coração aflito.
In “Poemas no espaço tempo (2013)


(…) Que no entanto o rio nos iluda, com sua eterna melopeia aguda. David Mourão-Ferreira.
Pastoral de Beethoven, 6ªsinfonia em fá maior.
Allegro ma non troppo, Andante molto mosso,
Allegro, Allegro, Allegretto.
Flautas, oboés e clarinetes, fagotes, trompas e trompetes,
tímpanos, violoncelos, contrabaixos, violas, violinos.
A música, como se fora um rio,
ora doce, ora revolto.
E o rio, a fluir, compondo hinos.
In Entre margens (2013)


Salpicos de sangue em mar de tons verdes,
as papoilas de Monet
derramam acordes na sonata nº 5 de Beethoven.

A noite apagou o Sol que ateou
as searas de Van Gogh.
Enleiam-se sonhos nos acordes de Mendelssohn.

Vestiu-se em tons de ocre e ferrugem
a vinha de Malhoa,
prima dona no concerto em fá maior de Vivaldi.

Árvores desnudas dançam, lânguidas,
nas telas nevadas de Sisley.
Sopram os ventos de inverno de Chopin.
In Quando o mel escorre nas searas (2016)

Mudo, o piano a carecer de afinação.
Outrora, mãos virtuosas
faziam escorrer do teclado
suites, tocatas, fugas,noturnos de Chopin, sonatas de Schubert.
O ar ficava impregnado de azul, madressilva e mel.
In Quando o mel escorre nas searas (2016)

Mussorsky
Em tons laranja, ocre e pastel,
a grande porta de Kiev,
que Hartmann esboçou,
não passou da tela e do papel.
Mussorsky imortalizou-a numa partitura.
Sob a batuta de Gustav Dudamel,
os acordes gravados a laser no CD
flutuam no ar.
Pela janela entra a luz crepuscular
e a sala inunda-se de uma claridade
rósea e leda.
In Quando o mistério se dilui na penumbra (2017)

Schöenberg
Estrelas bordam a ouro um firmamento de breu.
No silêncio da noite, o lúgubre piar de uma coruja.
Sinal de agouro, morte...
O vento norte sopra dolente e frio.
Os ramos das árvores oscilam languidamente,
evocando sofrimento e dor.
Ao longe flutua uma melopeia
que se insinua no ar.
De início fria, violenta e dissonante,
vai-se transformando lentamente.
Sob os acordes de Schoenberg
tudo se transfigura.
No outro lado da noite adormeceu o vento
e já não se ouve o piar agoirento.
In Quando mistério se dilui na penumbra, 2017

Quando Kandinsky assistiu a um concerto de Arnold Schönberg, em 1911, ficou impressionado com a ordem musical atonal e alógica composta pelo músico.  O quadro Impressão III (Concerto) foi pintado a partir das sensações  ao ouvir o referido concerto.

A este propósito, incluo o vídeo anexo


Termino com o texto anexo, interessantíssimo, que pode ser lido no site anteriormente citado
The early years of the 20th Century signed a terrific advance in the Physical Sciences. The Special (1905) and General (1916) Theories of Relativity and the advent of Quantum Mechanics (1926) changed our lives profoundly. Around the same years, a similar revolution took place in both Music and Art. The year 1909 marks a decisive break with tonality (the structure of classical music) by Arnold Schönberg in his "Three Piano Pieces". The term 'Atonality' is commonly used to express this new type of composition. Wassily Kandinsky is credited with painting the first 'purely abstract' works. His production is vast and I could only include 20 of his works here, selected from a period of time that overlaps with the musical pieces by Schönberg presented in this video. They knew each other and have possibly influenced their works reciprocally. The video is an attempt to evince this intriguing 'connection' between music and painting.










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