Vou
fazer um breve interregno no “silêncio” que dura já há mais de um mês. E digo
breve, porque parto amanhã para férias.
No
dia 15 de julho, terça feira, fomos para
a “minha aldeia” e, como é habitual, levámos alguns netos, desta vez o José e a
Marta.
Estava
previsto irem todos mas o Bernardo, muito ligado à mãe, à última hora desistiu.
A irmã, que já há 9 anos era companhia infalível, não quis deixar o irmão.
Ficou previsto que na sexta, dia 18, os pais iriam levá-los e ficariam então os
quatro connosco.
Mas
o “diabo teceu-as”.
Durante
o dia de quarta feira os miúdos brincaram, eu e eles fomos à mini piscina (aproveitamento
do antigo lagar de vinho) e consegui que a minha neta (vai fazer 4 anos)
ganhasse algum à vontade com a água. Após o jantar fomos ao parque infantil da
aldeia e ao regressar senti uma dor muito aguda no peito e muita dificuldade em
respirar. Não comentei o caso e no dia seguinte, quinta-feira, acordei bem. Fomos à vila (Alfândega da Fé) nomeadamente à Biblioteca e
enquanto o José foi jogar no computador (limite de tempo 30 min), a Marta foi para
a secção infantil brincar com outras crianças com as quais interagiu como se as
conhecesse desde sempre.
Era
feira na Vila pelo que ainda demos uma voltinha na feira e regressámos à
aldeia.
À
tarde o meu marido foi à outra aldeia, Adeganha, no concelho de Moncorvo (há
dois anos, por morte do irmão, herdou ali uma casa, tipo senhorial, bastante degradada
no interior) para continuar a tarefa ciclópica de organizar e eliminar “tralhas”
pois o meu cunhado era comprador compulsivo e é indescritível o caos que
encontrámos.
Só para dar uma ideia, deixo uma imagem de um dos compartimentos, mas em qualquer outro a situação era idêntica.
Voltei
com os miúdos para a “piscina” e continuaram os progressos da Marta. Quando saí
da piscina senti novamente a dor e a falta de ar mas imaginei que, tal como acontecera
na véspera, iriam passar em breve.
De
noite a dor e a falta de ar tornaram-se frequentes. Mudei de quarto para não
acordar o meu marido mas passei mal a noite pelo que, no dia seguinte, sexta feira,
contei o que se estava a passar e fui ao
serviço de urgência em Macedo de Cavaleiros.
Numa
radiografia aos pulmões foi detectada uma pneumonia. Teria que fazer umas análises
para se poder decidir se teria que ficar internada. Estive 5 horas na urgência
e o meu marido lá teve que “aguentar” com os dois netos, os mais irrequietos
dos quatro. Felizmente não tive que ficar internada. Nesse dia chegariam os outros
dois netos com os pais bem como o pai do José e da Marta (a mãe ainda está na
Argentina, num projeto de investigação). Chegaram, não para deixar os netos que
“faltavam” mas para levar os que
estavam...
Ficaram
até domingo e decidiu-se que eu viria para o Porto com eles para ser novamente
vista. Fui para a urgência (mais 5 h com os mesmos exames). O diagnóstico foi
confirmado, a medicação foi aumentada. O médico fez um relatório
circunstanciado e no dia seguinte, segunda feira, fui ao médico de família com o processo. Mais
um reforço de antibióticos...De acordo com o médico de família, decidi regressar ao Nordeste, não para a minha
aldeia, mas para a do meu marido, que é mais tranquila e para onde ele se mudou logo que eu lhe comuniquei a decisão. Ao fim do dia ainda consegui apanhar o
comboio (o meio de transporte de que mais gosto) para o Pocinho onde ele me
foi buscar. Na viagem, a beleza inigualável do Douro...
Quando
fomos para a minha aldeia levámos o gato, como é habitual no Verão. Só que não
nos lembrámos que era a festa da aldeia. Uma barulheira infernal (um conjunto
a emitir ruídos porque não àquilo não se pode chamar música) com um nível
sonoro muito acima daquele que é tolerável. Já no ano passado aconteceu o mesmo e o gato
ficou simplesmente histérico. Neste ano ficou de tal modo assanhado que se
atirava às pessoas pelo que o meu marido não o conseguiu levar.
Passados
dois dias foi buscá-lo e munido de luvas e casaco de couro, tentou apanhá-lo.
Por azar o gato conseguiu arrancar-lhe uma luva e mordeu-o em vários locais da
mão. Mas conseguiu apanhá-lo e lá foi ele para a Adeganha.
No
dia seguinte a mão estava vermelha e com um grande edema. Desta vez foi ele à urgência a Alfândega que é a vila que fica mais perto. Foi-lhe
de imediato receitado um antibiótico e, durante uma série de dias, teve que lá
voltar a fazer curativos.
Felizmente
eu tinha levado uma série de refeições congeladas, para poder estar mais
disponível para os netos e 15 dias antes tínhamos ido lá levar uma velha máquina
de lavar louça (estava aqui e foi substituída).
Tendo
que descansar o máximo possível, passei o tempo deitada ou sentada, a ouvir música
e a ler. Reli “Os velhos marinheiros”e “Farda, fardão,
camisola de dormir” de Jorge Amado, “O Evangelho segundo Jesus Cristo”
de Saramago, “Miss Esfinge” de Campos Monteiro (livro que tinha lido na
adolescência ) e li “Olhos nos Olhos” de J.Machado Vaz e “Fátima desmascarada”
de João Ilharco. Também folheei livros sobre vários pintores de que g
osto (Klee, Picasso, Chagall, Miró..)e Arcimboldo
que , embora não aprecie, não posso deixar de considerar fabuloso, para a sua
época, pois tudo era criado a partir de elementos geralmente naturais como frutos, mas também livros, etc
Estava
eu “posta em sossego” telefonou-me o pintor e escritor António Afonso, meu amigo de infância, que está como
comissário português de uma exposição internacional que iria inaugurar no Museu
Abade Baçal em Bragança, a 4 de Agosto com terminus a 28.
Queria que eu colocasse lá dois quadros meus. Gostaria de colocar os últimos que fiz, pigmentos naturais sobre sacos de azeitona. Não tinha nada comigo que valesse a pena. A única hipótese era pedir aos meus ilhos que os levassem quando fossem a 2 de Agosto.
Mas era preciso colocá-los em Bragança. Eu tinha que fazer um novo raio X para ver como evoluíra a doença. Lembrei-me então que uma ex- aluna minha, com quem mantenho contacto, estivera como médica em Bragança e tinha ido fazer um estágio no Brasil. Lembrei-me de lhe telefonar para me indicar onde deveria fazer a “vistoria”. Para grande alegria minha, estava de novo em Bragança e de imediato me mandou ir ter com ela ao Centro de saúde. Conciliando com a necessidade de alguém levar os quadros a Bragança, marquei a consulta para o dia 4. Assim levaria os quadros e se tivesse o aval médico, iria nesse mesmo dia à inauguração da exposição.
O meu amigo António Afonso disse não haver problema porque ele reservaria o lugar para os quadros e assim foi.
No dia 2 chegaram filhos netos, quadros e uma piscina insuflável. Na Adeganha não há lagar de vinho transformado em piscina, mas há um grande pátio onde a mesma foi instalada
Logo que soube da minha doença a Rita comentou, em jeito
de pergunta: Este ano não vai haver teatro, pois não? Respondi : Vamos ver o
que se pode arranjar...
Durante os meus repousos lembrei-me de fazer algo muito simples. A casa que o meu marido herdou é uma casarão...O meu cunhado, na
fase última da doença, por vezes tinha visões e dizia ter visto antepassados emergirem
das paredes. Lençóis brancos eram fáceis de arranjar, halibut
e talco para “pintar” rostos e cabelos também.
E assim surgiu uma peça muito simples...
Entretanto dia 4, em Bragança, fui muito bem atendida
pela minha ex-aluna Raquel e equipa. O mal parecia estar debelado. Mandou-me
tudo por e-mail para eu enviar ao meu médico de família (de quem a Raquel foi
aluna na Faculdade) que mal recebeu os dados me telefonou confirmando a boa
notícia. Assim pude ir à inauguração da exposição que foi precedida de um pequeno buffet para os participantes e respetivos acompanhantes.
Deixo dois vídeos, fotos de trabalhos da participação portuguesa e algumas fotos da inauguração que podem ver aqui
Regressando à Adeganha, filhos e netos passavam o dia
na piscina e eu assistia da varanda...
Nas horas mortas ensaiámos a peça.
Noites de terror no casarão
Atores:
1º fantasma- José (8 anos,
quase 9)
2º Fantasma-Marta (3 anos,
quase 4)
3º Fantasma-Bernardo (5 anos)
4º fantasma-Rita (12 anos)
Os actores, vestidos de fantasmas (lençóis brancos, rosto e
cabelos brancos) estão escondidos num quarto pequeno, perto da sala grande
Ouvem-se uns sons
metálicos macabros, uivos, arrastar de
móveis, chiar de portas...
(Voz da Rita)
Diz a lenda que três pastoras,
enquanto o rebanho
guardavam
a vários jogos,
jogavam,
mas sempre a mesma
ganhava
As outras, muito zangadas,
decidiram acabar
com aquele maldito
azar
Deitaram fogo à
terceira
que, mesmo assim na
fogueira,
continuava a ganhar
Arde e ganha…. Arde e
ganha….
Assim nasceu
Adeganha
onde tudo se vai
passar
(voz do José )
No enorme casarão,
bem no Largo da
Lameira,
vagueiam a horas
mortas,
por vezes a noite
inteira,
uns decadentes
morgados
Pobres
coitados….
Atravessam as paredes
e atravessam as
portas….
(vozes do Bernardo e da
Marta)
Fazem uma barulheira
Ouvem-se novamente os barulhos e a seguir entra o 1º fantasma com uma bengala
Vivo aqui há duzentos
anos,
sempre agarrado à
muleta,
infelizmente sem
cheta.
Isto não estava em meus
planos
Sai.
(Todos)
Uuuu
uuuuuu uuuuu
Ouvem-se novamente os barulhos e entra o 2º fantasma
Ainda sou fantasminha
Neste casarão, só
gosto da cozinha…
(vozes)
Ah Ah
Ah…
Ouvem-se novamente os barulhos e entra o 3º fantasma
Claro, tu só pensas
em comer
(vozes)
Ah
Ah Ah…
2º fantasma
E não
3º fantasma
E sim
2º fantasma
E não
3º fantasma
E sim
(Novamente os barulhos e entra de novo o 1º fantasma com a bengala)
Calem-se fedelhos.
Respeitem os fantasmas
mais velhos
(vozes)
Ah
Ah Ah…
Novamente os barulho e entra o 4º fantasma
Mas quem manda aqui
sou eu,
ouviste velho morgado?
Quero tudo sossegado
acordei com a
discussão.
Todos fora do casarão
Os outros 3 fantasmas
em coro
Não te zangues com a
malta.
Não te zangues, por
favor.
Todos nós fazemos
falta
para as noites de
terror
neste velho casarão.
4º fantasma
Tendes razão , podeis ficar,
mas hoje é tarde de
mais
e a farra terminou.
Ide deitar que eu já
vou.
Amanhã haverá mais…
Como
sempre terminámos com um RAP
No enorme casarão,
uuuuuuuuuuuuuuuuuuuuu, vagueiam a horas mortas
por vezes a noite
inteira, uns decadentes morgados. Pobres coitados….
Atravessam as
paredes e atravessam as portas….
Fazem uma
barulheira uuuuuuuuuuuuuuuuuuuuu
Mas não se assustem
senhores. Vamos contar um segredo.
Um até já está
gágá, tem as costas meias tortas e anda
sempre com muleta.
Dos outros, dois
são pequenos, e o mandão é uma treta.
Aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa
São fantasmas mais
ou menos, não vale a pena ter medo.
Boa noite meus senhores.Vão dormir, já não é cedo.
Um dia, ainda antes da representação, fui dar com a Marta e o Bernardo num dos
quartos a ensaiarem, por livre iniciativa, as suas “falas”
Uma ternura...
A peça foi
apresentada no a 7 de Agosto, dia do
aniversário do meu filho Miguel.
Foto tirada no fim do espetáculo. A Marta já despira o fato de fantasma...
Filhos e netos regressaram a 9 e nós a 10.
Dia 11 fui ao pneumologista, fiz provas funcionais
respiratórias e tive “permissão” de ir à China destino que o meu marido
escolhera e que era um dos seus grandes
sonhos ....Quando me foi diagnosticada a pneumonia, foi-me dito que ir ou não,
dependia da evolução da doença.
A muito custo eu e os filhos conseguimos convencê-lo a
ir mesmo que eu não pudesse. Ficou a aguardar, ansioso, todo este tempo.
Partimos amanhã.
Meu Deus, Regina, já andava inquieta para saber de ti, mas calculei que estivesses de férias com os meninos. Afinal foram férias atribuladas. Tanta azáfama com uma doença dessas não deve ser o recomendado. Oxalá tenhas conseguido mesmo debelar o mal e tenhas uma viagem descansada à China. Nada de subir montes e vales, pois lá não há médicos, nem urgências à mão!!!
ResponderEliminarQuando voltares, escreve no blogue a dizer que estás bem!
Parabéns pela família linda que tens.
Os meus andam pelos USA, já estiveram em Los Angeles e hoje partem para Palo Alto , onde vão morar nestes 10 meses. Irei lá em Outubro se Deus quiser. Para já vou para Ofir com a Luisa e Zé e depois para Leeds em Setembro.
Boa viagem! Bjinho
Obrigada Virgínia. Mas azáfama eu não tive porque a partir do momento em que foi detectada a doença ninguém me deixava fazer nada. Sobrou para marido, filhos, netos e particularmente para a minha nora que foi incansável todo o tempo em que esteve connosco.Quanto à família, se a minha é bonita a tua não o é menos. Até agora temos sido umas privilegiadas.
EliminarVejo que estás a encarar melhor a distância dos teus; por experiência sei que é penoso. O Miguel esteve em Grenoble( Erasmus) mas ficou o Nuno. O casamento do Miguel, dois anos depois, coincidiu com a ida do Nuno para Lille (Erasmus também) Mas hoje não há distâncias...
Quando chegar darei notícias. Um gd abraço
Regina
A Europa é toda perto. Consegue-se ir em três horas a quase todas as capitais. Nos EU as distâncias são descomunais e a viagem à California é de 15+3 horas o que não é brincadeira. Vamos a ver se me aguento. Vou com a Ana e venho com o João, coincidindo com idas e vindas deles ao Porto. Depois logo se vê...
EliminarA Luisa vai fazer um mestrado em legendagem na uni de Leeds e anda toda entusiasmada, pois tem algum dinheiro da PE dos novos manuais e eu ajudo no resto.
Quanto ao Zé irá para Melgaço, mas ainda está na Pesqueira a acabar sentenças e não vai ter quase férias nenhumas. Vou para Ofir cinco dias pois preciso de sair daqui e gosto muito daquele hotel, mesmo no inverno.
A tua neta está uma belezoca. Parecida com a Avó paterna??
Uma óptima viagem e volta bem!
Bjinhos
Querida amiga, nem sei que lhe dizer, a não ser repetir que tenho uma grande admiração por si. Estou muito contente por ter melhorado, mas não descuide a sua saúde. Ainda bem que vai à China principalmente por si, mas também porque poderei ter alguma informação em que confie.
ResponderEliminarUm grande beijo, mais uma vez, com toda a minha amizade e admiração.