Entrudo
Passei
parte da minha infância numa aldeia do concelho de Alfândega da Fé
onde regresso .com frequência. Ao longo do ano havia algumas
festividades essencialmente
religiosas,
o
Natal, a Páscoa, a festa de S. Tiago, orago da freguesia, e
duas
festas ( uma em maio, só religiosa, outra em setembro
a típica romaria transmontana) em honra de Santo Antão da Barca
cuja capela, então situada na margem direita do Sabor, foi há uns anos transladada por causa da construção da barragem.
A par dessas havia outras, de carácter pagão, nomeadamente o Entrudo, com os caretos, os casamentos e a queima do entrudo.
A par dessas havia outras, de carácter pagão, nomeadamente o Entrudo, com os caretos, os casamentos e a queima do entrudo.
Os caretos não tinham o “estatuto” dos caretos de Podence (https://www.youtube.com/watch?v=NCSjzvUTGdU)
Os caretos da "minha aldeia" eram rapazes, homens, meninos, fantasiados geralmente de raparigas e
disfarçados com umas máscaras rudimentares. Corriam em grupo
pela aldeia, alguns munidos de chocalhos e enfarinhando as pessoas (muito em especial mulheres e raparigas),
sempre que podiam.
A par dos caretos havia um cortejo humorístico. Recordo-me apenas de um “sketch”, teria os meus sete anos, que me divertiu muito. Um homem que fazia de “dentista”, tinha nas mãos um alicate enorme e transportava, às costas, uma máquina de sulfatar
Ao lado, um outro simulava
uma dor de dentes. Tinha a cara envolvida num trapo branco e gritava
Ai...ai…. Então o primeiro mandava-o abrir a boca, com a máquina de sulfatar fingia que a
desinfetava e, de seguida, com o alicate
simulava extrair o dente. Logo
depois
exibia na mão parte de uma dentadura de cavalo e
comentava Coitado do home. Como num l´abia de doer o dente....
E o “sketch” ia sendo repetido de onde em onde ao longo do cortejo.
Havia
também os casamentos satíricos que se passavam mais ou menos assim:
Na
noite do sábado
anterior
ao dia de carnaval, rapazes munidos com um funil para distorcer e
simultaneamente amplificar a voz, deslocavam-se para o ponto
mais elevado da aldeia e,
encobertos pela escuridão, procediam ao ritual do
casamento, de modo idêntico ao que descreve aqui
-
Ó camarada!
-
Olá companheiro!
-
Há aqui uma rapariga boa para se casar...
-
Quem é que lhe havemos de dar?
-
Damos-lhe fulano...
-
E que prenda lhe havemos dar?
-
Damos-lhe uma toalha de estopa!
No
fim do dia de carnaval ou na quarta feira de cinzas tinha lugar a
última celebração- a queima do Entrudo
simbolizado por um boneco de palha
Creio
que a partir dos meus 9 anos, nunca mais assisti a um entrudo na
aldeia. Em Bragança, no âmbito da atividades da escola festejava-se
o carnaval, mas de forma bem diferente. Alguns alunos
(essencialmente alunas) fantasiados, participavam num espetáculo com
música, poesia, danças regionais. Lembro-me de ter participado em
vários, tocando acordeão, dançando, cantando, mas fantasiada,
creio que só uma vez. Foi a minha mãe que imaginou e fez a
fantasia de baiana. Assim fantasiada , li um poema que um tio meu
sugeriu.
Lembrava-me apenas de dois versos do poema
Brasil
e Portugal trago-os no peito
Unidos
pela amizade e pela história
Mas este mundo fantástico da Internet. , permitiu-me chegar ao texto todo...
Sou
português e grito ao mundo inteiro
Filho de gente humilde, mas honrada
E se adoro o Brasil hospitaleiro
Jamais esquecerei a Pátria amada.
Brasil e Portugal trago-os no peito
Unidos pela amizade e pela história
Se devo a Portugal o meu respeito
Ao Brasil devo toda minha glória.
Sinto pela minha Pátria devoção
Mas amo tanto a Pátria brasileira
E chego a não saber se o coração
Ama a segunda mais do que a primeira
E por ser do Brasil um grande amigo
Sou brasileiro afirmo muita vez
E sinto orgulho igual de quando sinto
Nasci em Portugal, sou português.
Portugal é meu torrão natal
A Pátria mãe de heroís e de guerreiros
Mas se o Brasil nasceu de Portugal
Eu sou portanto irmão dos brasileiros.
Filho de gente humilde, mas honrada
E se adoro o Brasil hospitaleiro
Jamais esquecerei a Pátria amada.
Brasil e Portugal trago-os no peito
Unidos pela amizade e pela história
Se devo a Portugal o meu respeito
Ao Brasil devo toda minha glória.
Sinto pela minha Pátria devoção
Mas amo tanto a Pátria brasileira
E chego a não saber se o coração
Ama a segunda mais do que a primeira
E por ser do Brasil um grande amigo
Sou brasileiro afirmo muita vez
E sinto orgulho igual de quando sinto
Nasci em Portugal, sou português.
Portugal é meu torrão natal
A Pátria mãe de heroís e de guerreiros
Mas se o Brasil nasceu de Portugal
Eu sou portanto irmão dos brasileiros.
Com
esta pesquisa fiquei a saber que se trata da letra de um fado da
autoria de A. Ferreira e Gonçalves Dias, gravado em disco Odeon, em
1937,
um dos fados mais significativos do repertório de Manoel Monteiro
que, em 1949, foi homenageado pela classe artística brasileira com
um evento realizado no Teatro Carlos Gomes, por ter sido o primeiro
cantor português a ter sucesso no Brasil.
A
partir do ensino secundário desliguei-me das atividades de
carnaval. Só voltei a “envolver-me” quando os
meus filhos foram para o Jardim de Infância João de Deus. As
fantasias com que eles participavam nas festas de eram muito simples, imaginadas e feitas por mim e /ou pelo pai. Só encontrei duas fotos
mas aqui as deixo.
Voltei
a “reencontrar” o carnaval, agora com os netos. Em anos
anteriores já aqui coloquei fotos de cortejos escolares em que
participaram. Hoje fui assistir a mais um-o da Escola Bom Pastor,
que a minha neta mais nova frequenta. Mais uma vez pude constatar o
consumismo desta nossa sociedade. As fantasias são compradas e
algumas aparentam um custo relativamente elevado…
Deixo duas fotos desse cortejo
Termino com Chico Buarque- Quem te viu, Quem te vê e Vai passar