Na última mensagem falei das cerejeiras em Alfândega da Fé.
Durante muitos anos, a árvore mais associada ao concelho era a amendoeira. Hoje
os amendoais estão a ser progressivamente abandonados (poema Nostalgia) mas, nesta época, ainda
podem ver-se várias árvores floridas (poema Flores de amendoeira).
Quando passo
num amendoal, após o verão, sinto um misto
de nostalgia e emoção
ao ver a
amêndoa abandonada nas árvores e
no chão.
Outrora
significou prosperidade e eram
guardados os amendoais
para garantir
que os rebusqueiros não rebuscavam
demais,
que rebuscavam
só no chão, à claridade, só de dia e
não ao lusco-fusco.
Hoje já
ninguém anda ao rebusco.
No Verão, sob um sol abrasador, era a apanha.
Hoje fica nas
árvores e cai na terra que a
arrebanha e com ela se funde;
confundem-se
os seus tons.
Da escacha já
há muito não se ouvem sons.
Os
escachadores ora em uníssono,
ora
desfasados, habilmente manejados
com gestos
secos, certeiros e breves
por mulheres,
crianças, raparigas,
que enchiam o
ar de risos e cantigas,
iam partindo a
amêndoa, sempre cadenciados,
deixando o
grão intacto ou com mazelas leves,
enquanto das
cascas, o monte crescia no chão.
Mais tarde, a
par da lenha, na lareira, iriam servir
para combustão.
O grão ia para
sacos de serapilheira.
Mais tarde era
vendido e o seu
destino era assim perdido.
Aquele que
ficava imperfeito, esbotenado, iria ser, mais
tarde, laminado,
misturado com
ovos e açúcar, nos rochedos (ver nota abaixo))
cujas receitas
eram envoltas em segredos
e cuja doçura
ocultava a agrura de tanta
fadiga e de tanto suor.
Eram a lavra,
a limpa, a enxertia, ano após ano
um ritual que se cumpria
e quando
floriam as amendoeiras, o lavrador
contemplava do cimo das ladeiras
aqueles véus
de noiva a perder de vista,
não com o
olhar breve de um turista, mas com um
profundo olhar, cheio de amor.
Na foto podem ver-se, a par das flores, amêndoas do ano anterior, por apanhar.
Flores
de amendoeira
As flores de
amendoeira, antes da Primavera,
cobrem a
ladeira como um branco véu
ou como vestes
de anjo que se esfumou no céu.
Impressa no
código genético a química magia
da ebúrnea
cor que recende a nostalgia
No passado fim de semana estive lá. Deixo duas imagens da vila
vista de longe e algumas imagens de amendoeiras floridas.