"O Doiro sublimado. O prodígio de uma paisagem que
deixa de o ser à força de se desmedir. Não é um panorama que os olhos
contemplam: é um excesso da natureza. Socalcos que são passadas de homens
titânicos a subir as encostas, volumes, cores e modulações que nenhum escultor,
pintor ou músico podem traduzir, horizontes dilatados para além dos limiares
plausíveis da visão. Um universo virginal, como se tivesse acabado de nascer, e
já eterno pela harmonia, pela serenidade, pelo silêncio que nem o rio se atreve
a quebrar, ora a sumir-se furtivo por detrás dos montes, ora pasmado lá no
fundo a reflectir o seu próprio assombro. Um poema geológico. A beleza
absoluta."
Miguel Torga in "Diário
XII"
É este o Douro que se apresenta com todo
os seu esplendor, nestas imagens da Quinta do Crasto
É este o Douro que Miguel Torga sublima
através dos seus poemas, não menos sublimes...
DOURO
Cai o sol nas ramadas.
O sol, esse Van Gogh desumano...
E telas amarelas,calcinadas,
Fremem nos olhos como um desengano.
A cor da vida foi além de mais!
Lume e poeira, sem que o verde possa
Refrescar os craveiros e os tendais
De uma paisagem mais secreta e nossa.
Apenas uma fímbria namorada,
Vermelha e roxa, se desenha ao fundo
O mosto de uma eterna madrugada
Que vem do incêndio refrescar o mundo.
Cai o sol nas ramadas.
O sol, esse Van Gogh desumano...
E telas amarelas,calcinadas,
Fremem nos olhos como um desengano.
A cor da vida foi além de mais!
Lume e poeira, sem que o verde possa
Refrescar os craveiros e os tendais
De uma paisagem mais secreta e nossa.
Apenas uma fímbria namorada,
Vermelha e roxa, se desenha ao fundo
O mosto de uma eterna madrugada
Que vem do incêndio refrescar o mundo.
DOIRO
Suor, rio, doçura.
(No princípio era o homem ...)
De cachão em cachão,
O mosto vai correndo
No seu leito de pedra.
Correndo e reflectindo
A bifronte paisagem marginal.
Correndo como corre
Um doirado caudal
De sofrimento.
Correndo, sem saber
Se avança ou se recua.
Correndo, sem correr,
O desespero nunca desagua ...
DOIRO
Corre, caudal sagrado,
Na dura gratidão dos homens e dos montes!
Vem de longe e vai longe a tua inquietação...
Corre, magoado,
De cachão em cachão,
A refractar olímpicos socalcos
De doçura
Quente.
E deixa na paisagem calcinada
A imagem desenhada
Dum verso de Frescura
Penitente
São Leonardo da Galafura
À proa dum navio de penedos,
A navegar num doce mar de mosto,
Capitão no seu posto
De comando,
S. Leonardo vai sulcando
As ondas
Da eternidade,
Sem pressa de chegar ao seu destino.
Ancorado e feliz no cais humano,
É num antecipado desengano
Que ruma em direcção ao cais divino.
À proa dum navio de penedos,
A navegar num doce mar de mosto,
Capitão no seu posto
De comando,
S. Leonardo vai sulcando
As ondas
Da eternidade,
Sem pressa de chegar ao seu destino.
Ancorado e feliz no cais humano,
É num antecipado desengano
Que ruma em direcção ao cais divino.
Lá não terá
socalcos
Nem vinhedos
Na menina dos olhos deslumbrados;
Doiros desaguados
Serão charcos de luz
Envelhecida;
Rasos, todos os montes
Deixarão prolongar os horizontes
Até onde se extinga a cor da vida.
Nem vinhedos
Na menina dos olhos deslumbrados;
Doiros desaguados
Serão charcos de luz
Envelhecida;
Rasos, todos os montes
Deixarão prolongar os horizontes
Até onde se extinga a cor da vida.
Por isso, é
devagar que se aproxima
Da bem-aventurança.
É lentamente que o rabelo avança
Debaixo dos seus pés de marinheiro.
E cada hora a mais que gasta no caminho
É um sorvo a mais de cheiro
A terra e a rosmaninho!
Da bem-aventurança.
É lentamente que o rabelo avança
Debaixo dos seus pés de marinheiro.
E cada hora a mais que gasta no caminho
É um sorvo a mais de cheiro
A terra e a rosmaninho!
Termino com o Rio Douro de Dórdio Gomes
Muito bonitos todos os poemas. E eu já tive a sorte de passear por esses sítios maravilhosos com a UPP.
ResponderEliminarUm beijo.
Também passeei por essas zonas quando vivia em Chaves, embora as estradas fossem diabólicas. São paisagens virgens ainda hoje.
ResponderEliminarAdoro o texto em prosa de Miguel Torga- sempre gostei mais da prosa dele do que da poesia.
Temos uma terra maravilhosa...
Já corri muitos mundos, mas s. Leonardo da Galafura encheu meus olhos e dilatou meu peito numa sofreguidão de reter a harmoia ,o cheiro a côr, a poesia,...
ResponderEliminarLindíssimos poemas do Grande e inesquecível Miguel Torga
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