Bem-vindo, bienvenido, bienvenu, benvenuto, welcome....


Silêncio cósmico

Pudera eu regressar ao silêncio infinito,

ao cosmos de onde vim.

No espaço interestelar, vazio, negro, frio,

havia de soltar um grito bem profundo

e assim exorcizar todas as dores do mundo.

Regina Gouveia

NOVO BLOGUE

Retomei o blogue que já não usava há anos.

https://reflexoeseinterferncias.blogspot.com/

Dedico-o essencialmente aos mais novos mas todos serão bem vindos, muito em particular pais, avós, encarregados de educação, educadores ...


quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Meu quintal é maior do que o mundo.


Em mensagem anterior referi que me foi solicitada autorização para integrar o poema Big- Bang num “material didático de Química para o 1º ano do Ensino Médio, na Rede Salesiana Brasil”.

Big- Bang

Na minha infância,

o Universo estendia-se do Castelo até às Eiras,

envolvendo a Praça e o Cabecinho onde ficava a minha escola.

À volta eram ladeiras que velavam o sono do rio lá no fundo.

Era assim o meu mundo que, para mim, era maior que o infinito

e que em cinco linhas aqui ficou descrito, contrariando assim,

à evidência, uma das conjecturas da ciência.

Desde o seu Big-Bang o meu Universo contrai-se, não se expande.

 Gouveia, R.in Magnetismo Terrestre

Há dias, relia Manoel de Barros  e o poema que segue, de sua autoria, fez-me lembrar um pouco este meu poema Big-Bang.
O título desta mensagem fui buscá-lo precisamente ao poema de Manoel de Barros

Prezo insetos mais que aviões.
Prezo a velocidade
das tartarugas
mais que a dos mísseis.
Tenho em mim
esse atraso de nascença.
Eu fui aparelhado
para gostar de passarinhos.
Tenho abundância
de ser feliz por isso.
Meu quintal
É maior do que o mundo.

A propósito ainda de Manoel de Barros, há dias descobri na NET uma série de textos seus dedicados ao público mais jovem. Alguns trechos lembram-me Mia Couto. Aqui os deixo bem como um vídeo

O MENINO QUE CARREGAVA ÁGUA NA PENEIRA


Tenho um livro sobre águas e meninos.
Gostei mais de um menino
que carregava água na peneira.
A mãe disse que carregar água na peneira

Era o mesmo que roubar um vento

e sair correndo com ele para mostrar aos irmãos
A mãe disse que era o mesmo que
catar espinhos na água
O mesmo que criar peixes no bolso.
O menino era ligado em despropósitos.

Quis montar os alicerces de uma casa sobre orvalhos.

A mãe reparou que o menino
gostava mais do vazio
do que do cheio.
Falava que os vazios são maiores
e até infinitos.
Com o tempo aquele menino
que era cismado e esquisito
porque gostava de carregar água na peneira Com o tempo descobriu que escrever seria o mesmo que carregar água na peneira
No escrever o menino viu
que era capaz de ser
noviça, monge ou mendigo
ao mesmo tempo.
O menino aprendeu a usar as palavras.
Viu que podia fazer peraltagens com as palavras.
E começou a fazer peraltagens. Foi capaz de interromper o voo de um pássaro botando ponto no final da frase. Foi capaz de modificar a tarde botando uma chuva nela.
O menino fazia prodígios.
Até fez uma pedra dar flor!
A mãe reparava o menino com ternura.
A mãe falou:
Meu filho você vai ser poeta. Você vai carregar água na peneira a vida toda. Você vai encher os
vazios com as suas peraltagens e algumas pessoas
vão te amar por seus despropósitos.

 A MENINA AVOADA

Foi na fazenda de meu pai antigamente
Eu teria dois anos; meu irmão, nove.

Meu irmão pregava no caixote
duas rodas de lata de goiabada.
A gente ia viajar.

As rodas ficavam cambaias debaixo do caixote:

Uma olhava para a outra.

Na hora de caminhar

as rodas se abriam para o lado de fora.

De forma que o carro se arrastava no chão.

Eu ia pousada dentro do caixote

com as perninhas encolhidas.

Imitava estar viajando.

Meu irmão puxava o caixote

por uma corda de embira.

Mas o carro era diz-que puxado por dois bois.

Eu comandava os bois:

- Puxa, Maravilha!

- Avança, Redomão!

Meu irmão falava

que eu tomasse cuidado

porque Redomão era coiceiro.

As cigarras derretiam a tarde com seus cantos.

Meu irmão desejava alcançar logo a cidade -

Porque ele tinha uma namorada lá.

A namorada do meu irmão dava febre no corpo dele.

Isso ele contava.

No caminho, antes, a gente precisava

de atravessar um rio inventado.

Na travessia o carro afundou

e os bois morreram afogados.

Eu não morri porque o rio era inventado.

Sempre a gente só chegava no fim do quintal

E meu irmão nunca via a namorada dele -

Que diz-que dava febre em seu corpo.

terça-feira, 24 de setembro de 2013

Pôr do Sol

Termina hoje a minha série de"reportagens" sobre as férias no Nordeste

Já em anos anteriores me tenho referido aos meus fins de tarde, sentada no terraço a  ver o pôr do Sol. Desta vez não tive oportunidade de fotografar os melhores pois ocorreram quando a casa estava cheia de gente e a azáfama era muita…Depois foi a terrível vaga de incêndios e as nuvens de fumo que, por vezes interferiram com a observação do Sol. De qualquer modo deixo algumas imagens e alguns poemas alusivos.



 

Poema das coisas belas
 
As coisas belas,
as que deixam cicatrizes na memória dos homens,
por que motivos serão belas?
E belas, para quê?
Põe-se o Sol porque o seu movimento é relativo.
Derrama cores porque os meus olhos vêem.
Mas por que será belo o pôr do sol?
E belo, para quê?

Se acaso as coisas não são coisas em si mesmas,
mas só são coisas quando percebidas,
por que direi das coisas que são belas?
E belas, para quê?

Se acaso as coisas forem coisas em si mesmas
sem precisarem de ser coisas percebidas,
para quem serão belas essas coisas?
E belas, para quê?

Gedeão, A. in Poesia Completa 
 

Havia no meu tempo um rio chamado Tejo que se estendia ao Sol na linha do horizonte (...)António Gedeão

Corre um rio por detrás da linha do horizonte,
um rio onde se espelham lua e sol,
os salgueiros nas margens,
também os amieiros e os choupos
que, no verão, derramam sombra fresca
sobre o chão e sobre o rio,
que imagino por detrás da linha do horizonte,
lá onde, ao arrebol, o céu se torna rubro
e o sol já só se vê por refração.
Oculto por detrás da linha do horizonte,
o sol não passa de ilusão.
Onde a realidade? Onde a ficção?
Ser ou não ser, eis a questão.
Gouveia, R. in Entre margens

 



Santo Antão da Barca


Em mensagem anterior fiz uma breve referência à festa em honra de Santo Antão da Barca, uma das grandes romarias do concelho de Alfândega da Fé, que tinha lugar  nas imediações de uma  capela, junto ao Rio Sabor.
Um tio meu, ao tempo oficial na Base Aérea nº1  fez, em 1947, fotos aéreas do local.


 

 A capela, situada no termo da minha aldeia, vai ficar submersa pela barragem e, por esse motivo, está a ser transladada pedra a pedra para um novo local.

Este ano a  festa realizou-se na aldeia e teve pouca afluência quando comparada com as festas  anteriores
 
Deixo algumas fotos da procissão acompanhadas do poema de António Lopes Ribeiro na voz de João Villaret

 




À noite, mais uma vez o ruído ensurdecedor mas desta vez, como foi longe de minha casa, incomodou-nos pouco.

 

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Os poetas não morrem...


Maria Teresa Horta afirmou que deve a sua vida literária ao poeta António Ramos Rosa, falecido hoje aos 88 anos, a quem enviou por correio os primeiros poemas.

"Devo muito ao António. A minha vida literária nasceu desse gesto solidário e isso é inesquecível", afirmou a escritora, recordando o dia em que enviou um envelope com vários poemas a Ramos Rosa, há mais de 50 anos.

"Foi a primeira pessoa a quem mostrei os meus poemas. Adorava a poesia dele e eu queria publicar. Telefonou-me a dizer que tinha gostado muito", lembrou Maria Teresa Horta, referindo que foi António Ramos Rosa quem lhe publicou o primeiro livro de poemas, "Espelho inicial".

"Era um excelente poeta e nunca deixámos de manter contacto. Para mim os poetas não morrem", disse

 

 Nas aulas e a propósito da luz,  usei várias vezes um poema seu.

….A luz não procura um lugar

para ser a luz

ela cria o lugar no imediato movimento

de uma lentidão imperceptível

com o seu absoluto olhar sem centro

ela é o próprio mundo

no seu espaço absoluto

mas sem o mundo talvez pudesse deixar de ser a luz que se propaga

para criar na sua solidão autónoma

a ilha de um silêncio branco

que seria inteiramente a sua nudez interior.

António Ramos Rosa, poema inédito publicado em Palavra em Mutação, nº6Zero, 2004/2005

 
Sobre o Poeta podem ler mais aqui

 
 
Até sempre Ramos Rosa

 

 

Amoras


O meu neto Ju tem dois amiguinhos lá na aldeia que mal pressentem a sua presença se apresentam junto ao portão para brincarem com ele. Todos têm oito anos ( o meu neto, o Mais novo dos três, fê-los há dias). O mais velho, mais pequenito em tamanho, frequenta o 2 º ano de escolaridade, o Ju e o outro frequentam o 3º.

Tinha que estar sempre a moderar as suas brincadeiras pois quer o meu neto quer o mais pequenito são muito irrequietos. Propunha competições (corridas de carrinhos, tiro ao alvo, etc) e depois subiam ao pódio para receber taças (copos plásticos com guloseimas). Quando começavam a ficar menos “controláveis” saíamos, geralmente a colher amoras.

Vivendo ambos sempre na aldeia, é estranho que o mais velhito só há um ano se tenha apercebido da existência das amoras, quando uns familiares que vivem fora foram passar férias à aldeia e decidiram ir colhê-las.
Vejo estes episódios com tristeza. Quando eu era pequena ia com outras crianças colher amoras. Os caminhos eram belíssimos, frondosos e as amoras emergiam tentadoras, por entre os silvedos.

Os caminhos hoje estão completamente abandonados, salvo aqueles que permitem a passagem de viaturas motorizadas . Quando comentava isto com um familiar que ali estava de férias, disse-me. É natural, já não têm serventia.

Não terem serventia significa apenas que transitá-los já não proporciona qualquer lucro em termos monetários.,

Faz-me pena esta sociedade que valoriza acima de tudo o dinheiro.

Mas voltemos às amoras.


Tal como acima referi, uma das crianças vai frequentar o 3ºano. O livro adotado para Português foi precisamente o que referi na mensagem anterior e que contém dois textos meus. Num dia em que andávamos a apanhar amoras, comentou. Quando eu disser na escola que andei às amoras com a escritora que escreveu aqueles textos, ninguém vai acreditar...


A terminar, alguns poemas com referência às amoras

As amoras

O meu país sabe a amoras bravas

no verão.

Ninguém ignora que não é grande,

nem inteligente, nem elegante o meu país,

mas tem esta voz doce

de quem acorda cedo para cantar nas silvas.

Raramente falei do meu país, talvez

nem goste dele, mas quando um amigo

me traz amoras bravas

os seus muros parecem-me brancos,

reparo que também no meu país o céu é azul.

Eugénio de Andrade, O outro nome da Terra

Xisto


Muros de xisto, tal como outrora

cobertos de silvas, ostentando amoras.

Caminhos.

Este já foi ribeiro, o ribeiro dos linhos.

Já não existe ribeiro, tão pouco o linho.

O pó esvoaça lento

por sobre o chão incerto e poeirento.

Caminho com dificuldade,

o sol poente ofusca-me a visão.

Percorro outro caminho, o da memória

que, como o xisto, se esboroa com o tempo.

Firme, a mão do meu pai segura a minha mão.


Gouveia, R. In Entre margens

Teia


Com as recordações da minha infância fui tecendo, dia a dia, enredada teia.

O cheiro do azeite no lagar e no Outono a fermentar o mosto,

o céu estrelado, o luar de Agosto, as cores da Primavera e as do Outono,

o vermelho das papoilas, dos medronhos, o branco das flores de amendoeira,

o sabor das amoras de silva ou de amoreira, as histórias contadas à lareira o som da chuva , da neve, do granizo, na escacha da amêndoa, o som do riso,

o rumorejar do rio no fundo da ladeira, o piar da coruja, o bramir do vento,

são imagens que preenchem os meus sonhos

e assim invadem o meu pensamento, enredando-o na emaranhada teia

que até hoje a minha vida prende

por um fio, que tanto se contrai como distende.


Gouveia, R. In Magnetismo Terrestre

 

Uma agradável surpresa....


Há dias quando, ainda na aldeia, acedia ao correio electrónico deparei com um e-mail do editor do meu livro  Magnetismo Terrestre,  dando-me conta do e-mail abaixo, que lhe fora dirigido

Prezados senhores:

A Rede Salesiana Brasil, responsável pela produção do material didático da Rede Salesiana de Escolas, está desenvolvendo um novo projeto didático para atender as suas escolas a partir de 2014.          

Trata-se de uma proposta pedagógica que objetiva, além de outras finalidades, desenvolver habilidades e competências em pesquisa, leitura e interpretação de diferentes fontes informativas em todas as disciplinas.

Para estudo em sala de aula, o autor Sérgio Ribeiro Frois selecionou o texto reproduzido abaixo para inclusão no material didático de Química para o 1º ano do Ensino Médio, a ser publicado na forma impressa, e na digital em ambiente virtual fechado (disponível no Portal Futurum para os usuários participantes da RSE, mediante senha pessoal de acesso), pelo prazo de 5 (cinco) anos, pelo que pedimos sua autorização.

Material didático da RSB: Química - 1º ano do Ensino Médio.

Autoria: Sérgio Ribeiro Frois.

Texto de terceiros a ser usado: GOUVEIA, Regina. Magnetismo Terrestre. Porto: Fundação Dr. Luís Araújo, 2006.

Big-Bang

Na minha infância,

o Universo estendia-se do Castelo até às Eiras,

envolvendo a Praça e o Cabecinho onde ficava a minha escola.

À volta eram ladeiras que velavam o sono do rio lá no fundo.

Era assim o meu mundo que, para mim, era maior que o infinito

e que em cinco linhas aqui ficou descrito, contrariando assim, à evidência, uma das conjecturas da ciência.

Desde o seu Big-Bang o meu Universo contrai-se, não se expande.

Atenciosamente,

Em face do e-mail o editor pretendia saber se eu autorizava a publicação do poema. É óbvio que autorizei. Fico contente ao ver que, mais uma vez, poemas meus viajam para longínquas paragens…

Já aqui referi em tempos que soube por acaso, que dois poemas meus constam no livro de Português, 3º ano, Alfa, Porto Editora.Tenho pena que os autores não tenham tido a gentileza de me abordarem, tal como agora foi feito.

Fiz este meu desabafo junto da Porto Editora que me ofereceu dois exemplares do referido livro  ( a edição anterior e a última edição, para o novo ano lectivo, com alterações face às novas metas curriculares).


 

domingo, 22 de setembro de 2013

Um sábado diferente

Ontem e porque o dia foi diferente, decidi fazer mais um breve interregno nas minhas "reportagens" de férias...

Fui a Miguel Bombrada onde decorreram  as Inaugurações Simultâneas

Havia imensa animação, muito em particular na Rua de Cedofeita.
Limitei-me a passar. Não fiz a habitual visita às galerias, penso fazê-la com calma nos próximos dias,  pois tinha programado uma tarde diferente, uma visita à casa Andresen.
 
Há animais à solta na escuridão da Casa Andresen, a exposição Animais no Museu, de Antonio Pérez Rodríguez

Fui com o meu filho mais velho e a família. Todos gostámos, particularmente o meu neto Bernardo que só ficou triste porque “queria mais...”

Outra razão que me levou à casa Andresen foi o "regresso da poesia à Casa de Sophia

Esta foi a  segunda sessão organizada pelo grupo “Asas de Poesia”. constituído por Carlos Andrade, David Cardoso, Libânia Madureira, Manuela Barroso, Nuno Sá, Orlando Mesquita e Teresa Gonçalves. Do grupo conhecia Carlos Andrade que tem participado em várias atividades levadas a cabo pela Vivacidade e foi um dos animadores do grupo coral que ali foi criado, grupo que integrei mas que infelizmente já não existe. Conhecia também Orlando Mesquita que já não via há décadas. Foi professor de viola dos meus filhos a quem falei da sessão mas  só o meu filho mais velho teve disponibilidade para ir.

A sessão, com o título “É sempre poesia”, teve a participação dos “diseurs” Alzira Santos, António Portela, Cristina Pessoa, David Cardoso e dos músicos-compositores Carlos Andrade e Orlando Mesquita, acima referidos. Foram ditos poemas de José Régio, David Mourão Ferreira e de elementos do grupo “Asas de Poesia”.

Numa das suas intervenções Carlos Andrade tocou e cantou “Só assim será poema” de Hélia Correia, musicado por José Jorge Letria.
O refrão foi acompanhado por vários elementos do público, nos quais me incluí.

Foi um momento bonito mas também triste porque os ideais de Abril há muito "murcharam” como tão bem cantou Chico Buarque ( em tempos bem menos difíceis que os de agora...)

Mas voltemos ao poema de Hélia Coreia. Aqui fica a letra. Tentei encontrar na NET uma versão cantada. Eis a única que consegui
 
Que o poema tenha carne
ossos vísceras destino
que seja pedra e alarme
ou mãos sujas de menino.

Que venha corpo e amante
e de amante seja irmão
que seja urgente e instante
como um instante de pão.

Só assim será poema
só assim terá razão
só assim te vale a pena
passá-lo de mão em mão.

Que seja rua ou ternura
tempestade ou manhã clara
seja arado e aventura
fábrica terra e seara.

Que traga rugas e vinho
berços máquinas luar
que faça um barco de pinho
e deite as armas ao mar.

Só assim será poema
só assim terá razão
só assim te vale a pena
passá-lo de mão em mão.

 
Deixo também um dos poemas de David Mourão Ferreira que ali foi dito, um soneto  que é um dos poemas seus de que mais gosto

 
E por vezes as noites duram meses
E por vezes os meses oceanos
E por vezes os braços que apertamos
nunca mais são os mesmos E por vezes

encontramos de nós em poucos meses
o que a noite nos fez em muitos anos
E por vezes fingimos que lembramos
E por vezes lembramos que por vezes

ao tomarmos o gosto aos oceanos
só o sarro das noites não dos meses
lá no fundo dos copos encontramos

E por vezes sorrimos ou choramos
E por vezes por vezes ah por vezes
num segundo se envolam tantos anos.

sábado, 21 de setembro de 2013

Museu do Ferro


O Museu do Ferro  da Região de Moncorvo é uma instituição museológica e cultural destinada a promover o conhecimento e a divulgação do património arqueológico e industrial do território, dos povoados e das comunidades que se formaram nas cercanias da serra do Reboredo e do Vale da Vilariça, com particular destaque para as actividades relacionadas com a exploração do Ferro.




Outras imagens do Museu podem ser vistas aqui
 
Levámos  o Ju a conhecer o Museu e de seguida fomos á Serra do Reboredo onde apanhámos algumas pequenas "pedras" de hematite

De seguida fomos mostrar-lhe  a belíssima vila de Moncorvo mas ele, de planta na mão, fez de guia
 
Deixo um vídeo sobre Moncorvo onde, para além da vila, surgem as várias aldeias do concelho, nomeadamente a Adeganha de que falei em mensagens anteriores

 

Mazouco


No dia 31  de Agosto o meu filho Nuno apareceu com a família. Decidimos que à tarde iríamos ver o “Cavalo de Mazouco”, passando primeiro pela praia fluvial da Congida
 
 

 

O “Cavalo de Mazouco” situa-se perto de Mazouco (concelho de Freixo de Espada à Cinta) e integra-se na  primeira estação portuguesa de arte rupestre paleolítica ao ar livre, identificada e divulgada em 1981.

Estão representadas muito poucas figuras, entre as quais sobressai a representação de um cavalo.

O acesso às gravuras não é muito fácil. A partir da aldeia de Mazouco segue-se por uma estrada estreita e sinuosa. A dada altura encontra-se assinalado ( a meu ver, de forma um pouco deficiente) o percurso final que tem que ser feito a pé, por um caminho curto mas íngreme e pedregoso.  

 


Após a visita retomámos o caminho em sentido contrário até  encontrarmos de novo a estrada nacional que nos levaria a Lagoaça . A noite chegou entretanto e brindou-nos com uma vista fabulosa sobre Mazouco.




Feitas as fotos fomos jantar a Lagoaça de onde regressámos à aldeia. Chegámos por volta da meia-noite.
No dia seguinte o meu filho regressou ao Porto mas o meu neto Ju ficou connosco

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

As fugas do gato


O meu gato Fuscas faz o encanto  dos meus quatro netos. É o 4º gato que temos. Após a morte do 3º, decidimos não ter mais nenhum. Mas há 7 anos não conseguimos resistir ao apelo da minha neta Rita. Assim surgiu o Fuscas. Foi ela a madrinha, por isso lhe escolheu o nome. Quando ao longo do ano fazemos pequenas saídas do Porto o gato fica entregue aos cuidados da Rita e dos pais. Mas no Verão, porque todos partem de férias, o gato acompanha-nos para a aldeia.. No primeiro ano em que isso aconteceu, ao entrar na nova casa assustou-se imenso. Escondeu-se tão bem escondido num dos vários compartimentos que nos custou a encontrar. Chegámos a admitir que, nalgum momento de descuido, o portão tivesse ficado aberto e ele tivesse fugido. Depois foi-se habituando e a sua estadia é já preenchida com alguns rituais. Sempre que saímos ele vai para o muro do terraço e ali fica à nossa espera. Quando vê o carro assomar na rua sai do seu posto e vai esperar-nos para o pátio, junto ao portão, na fachada oposta da casa.

 


Há dois anos resolveu ensaiar a primeira fuga. Era já ao lusco-fusco. Tínhamos acabado de jantar quando um vizinho e ainda familiar, a passar férias na aldeia, nos bateu ao portão dizendo que tinha avistado na rua um gato parecido com o nosso. Na casa, numa porta exterior que dá para um dos pátios, existia uma pequena abertura para permitir a livre circulação de gatos que se encarregavam de comer os ratos que eventualmente aparecessem na adega. Esta era uma prática habitual em muitas casas da aldeia. O meu marido tinha tido o cuidado de colocar uma pedra a obstruir a abertura mas o gato conseguiu desviá-la  e passar. Saímos a procurá-lo coma  ajuda do vizinho e familiar. Nem sinais do gato. Ficámos desolados por nós e pelas crianças. Iriam ficar muito tristes quando soubessem do sucedido.

Era já 1 h quando decidimos deitar-nos. Antes fiz uma última tentativa. Chamei-o do terraço e ouvi o seu miado no terreno em frente. O meu marido foi buscá-lo. No dia seguinte a abertura da porta foi eliminada.

 Este ano resolveu empreender nova fuga. O portão de ferro da casa é pesado e por vezes fecha mal. Numa das minhas saídas deve ter acontecido isso pelo que a dada altura e uma  vez mais ao lusco-fusco, nos apercebemos de que o gato não estava em casa. Saímos a procurá-lo e várias pessoas nos confirmaram que tinham visto um gato com as características descritas. Alguém nos disse que o vira a fugir dum cão que o perseguia. Quando  nos deitámos, por volta das 3 h não havia sinais do gato. No dia seguinte várias pessoas bateram ao portão dizendo que estava algures um gato desconhecido. Lá íamos mas não era o Fuscas. Durante dois dias não acompanhei o meu marido nas suas idas para a Adeganha (aldeia de que falei em mensagens anteriores) para poder abrir o portão ao gato, caso ele chegasse. No 2º dia, estava preparar o almoço para mim e para a minha amiga Lourdes Sendas que me comunicara a sua chegada. Tinha um assado no forno, quando me pareceu ouvir o gato. Desci as escadas mas no preciso momento em que abri o portão passou o camião do lixo. O Fuscas é muito assustadiço pelo que deve ter fugido a sete pés. Fui chamá-lo pelas imediações mas não obtive resposta. Quando cheguei a casa ainda consegui salvar o assado embora um pouco esturricado…

À noite, quando o meu marido chegou da Adeganha, contei-lhe o sucedido. Admitiu que o gato estaria escondido por perto. Foi chamá-lo e a dada altura ouviu-o miar em cima dum telhado. Tínhamos gato, novamente…
 
E, a propósito de gatos, deixo dois poemas e uma obra de Júlio Resende

Poema do gato
Quem há-de abrir a porta ao gato
quando eu morrer?

Sempre que pode
foge prá rua,
cheira o passeio
e volta pra trás,
mas ao defrontar-se com a porta fechada
(pobre do gato!)
mia com raiva
desesperada.
Deixo-o sofrer
que o sofrimento tem sua paga,
e ele bem sabe.

Quando abro a porta corre pra mim
como acorre a mulher aos braços do amante.
Pego-lhe ao colo e acaricio-o
num gesto lento,
vagarosamente,

do alto da cabeça até ao fim da cauda.
Ele olha-me e sorri, com os bigodes eróticos,
olhos semi-cerrados, em êxtase,
ronronando.

Repito a festa,
vagarosamente.
do alto da cabeça até ao fim da cauda.
Ele aperta as maxilas,
cerra os olhos,
abre as narinas.
e rosna.
Rosna, deliquescente,
abraça-me
e adormece.

Eu não tenho gato, mas se o tivesse
quem lhe abriria a porta quando eu morresse?

Gedeã,A. in Novos Poemas Póstumos

   

Sonho

 
Decidi ir agarrar um sonho.

um sonho distante e desmedido.

Imaginei partir com companhia.

Talvez o  meu gato (eu tenho um gato, 

o que não acontecia a Gedeão) mas logo pensei: Não.

Quando  visse o sonho a esvoaçar 

havia de cuidar que era uma  ave.

Gatos e aves nunca se deram bem

à exceção do gato malhado

e da andorinha Sinhá  de Jorge Amado.

Pensei então levar alguém,  mas quem?

Os nossos sonhos

raramente coincidem com os sonhos de outrem.

Parti sem mais ninguém.  Fui de balão.

Não o enchi com hidrogénio, com hélio,

nem ar quente.

Enchi-o simplesmente de ilusão 

e assim me aventurei.

Aproveitei as correntes ascendentes, 

ao sabor do vento rodopiei no ar,

tempestades e tormentas  tive que enfrentar

mas continuei,  por vezes sem sentido,

em busca do sonho  distante, desmedido.

Quanto mais subia, mais distante o sonho parecia,

até me aperceber  que não subia

e que, vertiginosamente, descia  em direção ao chão.

Talvez tivesse havido uma fuga de ilusão.

Pensei em frei Gusmão, em Charles, em Zeppelin 

e assim tentei uma outra vez, 

outra,  e ainda mais uma.

Tudo se repetiu como da vez primeira.

Quero ainda tentar mais uma vez, a derradeira.

Mas como hei de eu encher o meu balão

se é já tão pouca a ilusão,  quase nenhuma?